segunda-feira, 17 de fevereiro de 2014

LEONARDO SAKAMOTO - Pequenos contos...


Aos sábados, vovô colocava seu terno mais bonito e seguia para o baile. 
Escolhia sempre o mesmo banco e lá ficava, esperando.

Uma noite, o porteiro o viu saindo de mãos dadas com alguém. Descreveu a imagem que eu tinha da minha avó, das histórias que ouvia desde pequeno.

Uma hora depois, papai foi chamado ao baile porque vovô resolvera dormir para sempre, sentado no banquinho. Parecia feliz.

28 de janeiro 2014
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Vovô, um dia, parou de falar. 
Zenaide dizia que tinha esgotado as palavras. 
Dr. Roberto, lá da cidade, explicava que foi grande trauma. 
Minha avó resmungava que era mula empacada. 

Na surdina, fui vê-lo roçar e, surpresa, dei com ele tagarelando com andorinhas, aconselhando saguis e fofocando com o gado. 
Já de volta, quando a primeira lua cheia do ano surgiu, acenou a todos com a aba do chapéu e se retirou - para nunca mais ser visto.

Herdeiro do silêncio dele, só eu sei que vovô não morreu. 
Mora, agora, dentro de mim.

17 de fevereiro 2014
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Leonardo Sakamoto é jornalista e Doutor em Ciências Políticas.
Blog do Sakamoto - UOL

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