domingo, 13 de novembro de 2016

Um conto de fadas - análise Junguiana

Rumpelstiltskin 
Hellen Reis Mourão -  agosto de 2016



Rumpelstiltskin ou Rumpelstilsequim é o personagem homônimo e principal antagonista de um conto de fadas original na Alemanha. 
Este conto foi coletado pelos Irmãos Grimm, em 1812, sendo revisado em edições posteriores.

Um pobre moleiro, para impressionar o rei, com o objetivo fazê-lo casar com a sua filha, mente e diz a ele que ela é capaz de fiar palha e transformá-la em ouro.

O Rei chama a moça, fecha-a em uma torre com palha e uma roda de fiar, e exige-lhe que transforme a palha em ouro até a manhã, durante três noites, ou será executada.

A moça já tinha perdido toda a esperança, quando aparece um anão (em algumas versões um duende) no quarto e transforma toda a palha em ouro em troca do seu colar; na noite seguinte, pede-lhe o seu anel. Na terceira noite, quando ela não tinha nada para lhe dar, o duende cumpre a sua função em troca do primeiro filho que a moça tivesse.

O Rei fica tão impressionado que decide se casar com ela, mas quando nasce o primeiro filho do casal, o anão regressa para reclamar o seu pagamento.

A Rainha, que havia esquecido-se dele, ficou assustada e ofereceu-lhe toda a sua riqueza, se este a deixasse ficar com a criança. O anão recusa, mas por fim aceita desistir da sua exigência, mas cria outra: se a Rainha conseguisse adivinhar o seu nome em três dias.

No primeiro dia, ela falhou, mas antes da segunda noite, o seu mensageiro ouve o duende a saltar à volta de uma fogueira e a cantar. E na musica ele diz seu nome Rumpelstilsequim
Quando o anão foi ter com a Rainha no terceiro dia, ela revela o nome dele, e ele perde o seu negócio, e cego de raiva, se divide em dois.

A heroína do conto é uma jovem bonita, mas pobre. E, como heroína, sabemos que ela irá resgatar e salvar algo.
No conto sua mãe é ausente, o que nos faz supor que ela pode ter morrido. 
Além disso, não havia uma rainha. Com isso podemos supor que a sua missão é resgatar o feminino que está desvalorizado. 
Seu pai, ao mentir e dizer que ela transforma palha em ouro lhe dá um valor que mesmo não reconhecido existe nela.

O ato de fiar, tecer é essencialmente feminino. Um trabalho que exercita a paciência e que auxilia a natureza feminina a se desvencilhar do seu lado masculino.

O ouro é algo de grande valor e incorruptível;  nos mitos africanos está ligado à deusa do amor.

Podemos concluir, então, que ela está fiando e tecendo seu valor enquanto mulher e resgatando o feminino na consciência coletiva. 
Mas com isso ela terá de lidar com uma figura zombeteira, um anão ou duende. 
O anão simboliza pequenos impulsos de caráter engraçado ou vulgar.
Muitas histórias dizem que eles fazem o trabalho por nós, o que é o caso aqui. 
Entretanto, ele pede por três vezes algo de valor em troca, mostrando que ela também deve dar algo dela mesma nesse esforço de resgate do feminino e que deve aprender a negociar, ao invés de competir como é típico do masculino.

A questão das três provas é comum nos contos de fadas. 

Ao terminar pela terceira vez de fiar, o rei resolve se casar com ela. Mas ela se esquece do anão, ou seja, ela se esquece desse impulso brincalhão, mas que pode ser muito criativo. E esquecer um impulso faz com que ele retorne com mais força.

E ele retorna querendo o seu bebê.  Ela precisa resgatar seus impulsos maternos.
Para o feminino o amor é mais valioso que ouro.  
Como prova ela precisa conhecer o nome do anão. Isso significa que ela precisa nomear seu conflito.

Em psicoterapia, quando damos um nome ao conflito alcançamos mais consciência.
É um insight que nos diz: “agora sei o que eu tenho!”, o que facilita a assimilação. 

Ao nomear Rumpelstilsequim ela o traz à consciência e ele deixa de ser uma força destrutiva e passa a ser uma força criativa que a ajudará a negociar com as demandas do mundo externo e interno sem perder sua feminilidade.


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Hellen Reis Mourão é analista Junguiana e especialista em Mitologia e Contos de Fadas.
Atua como psicoterapeuta, professora e palestrante de Psicologia Analítica em SP e RJ.
É colunista do site Fãs da Psicanálise.

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