Pensamentos em Itatiaia
Rubem Braga
De algum modo eu vivi aqui, eu existi um pouco nessas alturas há longos, longos anos.
Só as árvores mais antigas poderiam saber esse velho segredo triste, esse amor que se perdeu para sempre; este pensamento é tão pueril e romântico, essa coisa de árvores saberem coisas e se lembrarem das pobres coisas da gente!
Sinto-me só, triste, vazio, diante da lembrança desse amor antigo que em certo momento era tudo o que existia no mundo e que, entretanto, não existe mais, e é como se não tivesse existido, vive apenas na pueril, inexistente lembrança dessas velhas árvores, dessa água fria que desce da montanha cantando.
O rapaz moreno e magro que alguém um dia entreviu em meio a esses troncos é um triste senhor, agora real, vestido de preto, sentado aqui. A imaginar histórias tolas de velhas árvores que saberiam coisas, que sentiriam e guardariam pensamentos que alguém há muito tempo, há tanto tempo, teria pensado aqui. É um triste senhor gordo, triste como um pobre menino falando sozinho.
Há pensões finlandesas com vapores de sauna e banhos de córrego, e os hotéis tradicionais perdidos no bosque.
Sento-me em um tronco, fico ali quieto, como alguém que acaba de ser ferido.
O nome desse hotel de que eu jamais me lembraria me restitui aquela cuja imagem há pouco acreditei ver.
Daqui, talvez daquela pequena sala junto à entrada, há muitos e muitos anos, alguém me escreveu uma carta.
Não me lembro o que dizia; rasguei-a, depois de passar o dia inteiro na rua com esse papel no bolso, junto do coração, me queimando de ternura.
Aqui ela esteve, e estava triste. Por aquele caminho talvez tenha descido a cavalo, de manhã, os leves cabelos ao vento. Esta mesma luz do sol, coada por essas árvores, beijou-lhe as faces, na manhã de ar fino.
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