sexta-feira, 27 de maio de 2016

Romances Distópicos


5 GRANDES ROMANCES DISTÓPICOS
André Benjamim (*) - em "Homo Literatus"

Origem da palavra «distopia» e uma definição de romance distópico



A palavra distopia e suas derivadas, no sentido aqui utilizado para definir um conjunto diverso de romances, não se encontra na maioria dos dicionários, tanto da língua inglesa (onde foi utilizada primeiramente) como das línguas latinas. 
Em português distopia é um substantivo feminino, da área da medicina, que significa localização anómala de um órgão. 
O prefixo dis - quando derivado do latim, dis é um elemento de composição que exprime a ideia de separação, dispersão etc. (por exemplo, dissolver, distribuir). 
Pode também exprimir a ideia de dois (dissílabo, dístico). 
Quando derivado do grego antigo dys, o prefixo dis é um elemento de composição que exprime a ideia de dificuldade (dispneia) ou de falta, privação, mau estado (dissimetria, disenteria).

Muitos autores continuam a recusar o uso desta palavra que, entretanto, se generalizou. 
Ela é simultaneamente sinônima e antônima de outra palavra: utopia, sendo portanto uma espécie de palavra anômala. 
Para entendermos o verdadeiro sentido, atentemos no significado de utopia, palavra fabricada com recurso ao grego antigo que literalmente que dizer «não lugar» (ou, não + tópos, lugar): lugar ideal em que tudo estaria organizado da melhor forma para felicidade completa do povo, sendo portanto um sonho, uma quimera,  uma fantasia, uma concepção irrealizável. 
A palavra distopia, ganhando o sentido de anti-utopia, contra-utopia, utopia negativa, ou utopia negra, está para a utopia como o sonho está para o pesadelo, e só através desta última acepção se entende a disseminação da palavra distopia, e a aceitação do seu sentido íntimo.

Um romance distópico é, assim,  aquele que descreve, por antecipação, engenharias sociais que, apoiadas em mecanismos de controlo dos pensamentos, comportamentos, e atitudes, dos seus membros, e em mecanismos de repressão da dissidência, garantem a unanimidade totalitária. 

A ação dos romances distópicos decorre frequentemente em tempos futuros e locais inexistentes, embora possam ter ligação a territórios presentes. 
São criados na maioria das vezes como avisos ou sátiras, tentando demonstrar como as atuais convenções sociais, e a exploração de conhecimentos científicos, extrapolada aos limites, pode conduzir a sociedades castradoras dos indivíduos e da sua humanidade.
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1 – A Máquina do Tempo (1895), de H. G. Wells
A Máquina do Tempo é um livro mais conhecido enquanto obra de ficção científica, mas é também aquilo a que se convencionou chamar romance distópico. 
Publicado em 1895, reflete o pensamento de uma época dominada por profundas transformações científicas, políticas, econômicas e sociais que entre si se potencializavam. 
Era uma época em que as grandes descobertas científicas faziam com que o Homem sonhasse com uma nova sociedade, mais justa, mais igual, mais fraterna, mais confortável. 
Tudo se cria possível, e grandes sonhos nunca concretizados tomaram conta do pensamento daqueles tempos. 
Na literatura e na arte, apareceu depois o movimento denominado Modernismo (pai de todos os -ismos, período fecundo de grandes obras, mas também de imensas catástrofes, pai entre outros de um -ismo que tanta crueldade e mortandade trouxe ao mundo, o fascismo, e outros -ismos não menos mortais). Eram tempos em que se anteviam todas as possibilidades e todos os perigos.



Herbert George Wells, conhecido como H. G. Wells, nasceu em Bromley, localidade do condado de Kent, na Inglaterra, a 21 de Setembro de 1866, no seio de uma família de origens modestas. 
Para conseguir prosseguir os seus estudos, começou a trabalhar cedo, o que mais tarde lhe provocou uma doença pulmonar que o obrigava a uma vida sedentária. 
Para conseguir se sustentar começou a lecionar e a produzir trabalhos didáticos e só depois iniciou a escrita de romances e contos. 
Entre 1895 e 1900 escreveu uma série de romances de ficção científica que lhe trouxeram consagração quase imediata, e que são ainda hoje bem conhecidos, nomeadamente por causa de diversas adaptações cinematográficas: A Máquina do Tempo, A Guerra dos Mundos, O Homem Invisível, e A Ilha do Dr. Moreau
Após obter sucesso com estas obras, passou a dedicar-se a obras com um cunho social e político mais profundo, sobretudo obras de cariz ensaístico, na área da filosofia, história e política, onde defendia as suas teses socialistas e pacifistas, o amor livre, e a união de toda a humanidade, sem critérios de nacionalidade, credo, ou outras.

No âmbito aqui em análise, a parte distópica da obra A Máquina do Tempo, importa-nos a sociedade que o Viajante do Tempo (nunca é dito o seu nome) vai encontrar no ano 802701. 
Ao “estacionar” nesse longínquo ano no futuro, o Viajante do Tempo, vai encontrar uma sociedade que o obrigará a confrontar as suas ideias utópicas com a realidade. 
A sociedade não evoluíra da maneira por si imaginada. 
Após longos séculos a espécie humana encontra-se agora dividida em duas sub-espécies: os Elois e os Morlocks; os primeiros são belas criaturas que andam pela face da terra, despreocupadamente, vivendo o dia-a-dia num estado idealizado de inocência primitiva, vegetarianos, alimentados e vestidos pelos segundos, criaturas horríveis que vivem nas profundezas da terra, num sistema de túneis e indústrias, que saem somente durante o período de lua nova (não suportam qualquer tipo de luz) para caçar os Elois, que são o seu alimento.
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2 – Nós (1924), de Evgueni Zamiatine
Desconhecido durante muitos anos da maioria do público leitor, e até da maior parte dos círculos literários, o romance Nós, do autor russo Evegueni Zamiatine, nascido em Lebedian, a 1 de Fevereiro de 1884, foi escrito em Petrogrado, em 1920, mas o original russo apenas seria publicado na sua língua em 1952, não na então União Soviética, mas em Nova York. 
Na Rússia só seria publicado após a perestroica. 



A primeira edição do livro foi uma tradução inglesa, publicada em Nova York, em 1924; quatro anos depois foi publicada em França um tradução a partir do inglês – e durante muitos anos praticamente desapareceria de circulação e do conhecimento público. 
Evegueni Zamiatine faleceu a 17 de Março de 1931 em Paris, França.

Em Nós não existem indivíduos (Eu), existe apenas a comunidade (Nós); não existem pessoas, não existem cidadãos, existem números. 
D-503, o protagonista e narrador (os capítulos do romance são as entradas do seu diário) é um engenheiro responsável pela construção de uma nave que levará aos habitantes de outros planetas a mensagem da «felicidade matemática e exata». 
Estamos no século XXX, mil anos passaram desde que os «heroicos antepassados submeteram todo o globo terrestre ao domínio do Estado Único». 
Se os hipotéticos habitantes de outros planetas ainda viverem «no estado selvagem de liberdade», e não aceitarem a mensagem, o Estado Único, governado pelo Benfeitor, terá que recorrer às armas, pois considera que «é nosso dever forçá-los a ser felizes

Não há individualidade, portanto também não há privacidade: as casas são feitas de vidro, todos os habitantes são polícias uns dos outros e também não há exclusividade sexual. «O Estado Único levou a cabo uma ofensiva contra o outro dominador do Universo, ou seja, o Amor». 
Trezentos anos após a instauração do Estado Único, o Amor tinha sido «derrotado, isto é, foi organizado, matematizado». E a «Lex Sexualis» foi proclamada: «Qualquer número tem o direito de utilizar qualquer outro número como produto sexual.» 
Ficamos a saber tudo isto nas primeiras páginas do romance, pelo que estas revelações nada revelam da história, do enredo, da forma como tudo isto é operacionalizado. 
Como inspiração para toda a organização social Evegueni Zamiatine utiliza a figura de Frederick Winslow Taylor (Filadélfia, Estados Unidos, 1856-1915, operário e engenheiro que concebeu métodos científicos de estudo e organização do trabalho).

Quem tenha lido Admirável Mundo Novo e Mil Novecentos e Oitenta e Quatro, não deixará de notar certas semelhanças com Nós, motivo porque se crê que tanto uma obra como a outra terão sofrido a influência desta. Embora ambos fossem anglófonos, crê-se que tanto Aldous Huxley como George Orwell terão tido conhecimento da obra Nós através da tradução francesa, a primeira edição do livro publicada na Europa. Eram ambos conhecedores da língua francesa, como lerão a seguir.
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3 – Admirável Mundo Novo (1931), de Aldous Huxley
Aldous Leonard Huxley nasceu a 26 de Julho de 1894, em Godalming, Inglaterra, no seio de uma família com vários nomes conhecidos na Literatura e na Ciência, acabando por os destronar a todos, sendo hoje o mais conhecido dos Huxley’s; cresceu rodeado de figuras da elite intelectual britânica da época. 
O pai, Leonard Huxley, foi biógrafo e poeta; o avô, Thomas Henry Huxley, o professor que mais influenciou H. G. Wells, foi também um dos cientistas que ajudaram a desenvolver a teoria da evolução. 
Julian Huxley, irmão de Aldous, foi igualmente um escritor (e cientista, e administrador) famoso. Nos primeiros anos da sua carreira de escritor fez amizade com alguns dos mais proeminentes membros do Bloomsbury Group, entre os quais Virginia Woolf, E. M. Forster, e D. H. Lawrence. 
Vive dos pequenos rendimentos, e durante um breve período dá aulas de Francês em Eton, onde já havia sido aluno, e onde foi professor de Eric Arthur Blair, mais tarde mundialmente conhecido pelo seu pseudônimo George Orwell.


Entre 1919, ano em que casa com a belga Maria Nys, e 1931, ano em que publica Admirável Mundo Novo, vai publicando diversas obras menores, pelo menos em termos de sucesso;  tem um filho, o único, Matthew Huxley, viaja por França e Itália, na companhia de D. H. Lawrence, dedica-se à escrita de contos, ensaios, poemas, e peças de teatro. 
Em 1937 muda-se para os Estados Unidos, onde passa a década seguinte vivendo da escrita de roteiros para cinema – adaptou, entre outros, a obra Orgulho e Preconceito, de Jane Austen, em 1940. 

No final dos anos 40 e anos 50 inicia um novo período da sua vida, em que experimenta diversas drogas da moda naqueles anos, como LSD e mescalina; sob influência destas escreve três livros: As Portas da Percepção (1954, romance a que a banda The Doors deve o seu nome – o título do livro foi retirado de um verso de William Blake: "Se as portas da percepção fossem purificadas, tudo surgiria aos olhos do homem tal como é, infinito."), Céu e Inferno (1956), e Ilha (1962). 
Abandona as drogas e dedica os últimos anos da sua vida ao pacifismo e misticismo, vindo a morrer a 22 de Novembro de 1963, em Los Angeles, Estados Unidos.

A sociedade descrita em Admirável Mundo Novo (Huxley inspirou-se na peça A Tempestade, acto V, cena I, de William Shakespeare: O, wonder! / How namy goodly creatures are there here! / How beauteous mankind is! O brave new world, / That hath such people in’t!). 
Hoje,  o romance huxleyano que melhor sobreviveu à passagem do tempo, está organizado num Estado Mundial, assente em três divisas: Comunidade, Identidade, e Estabilidade. 
Aquilo que aparentemente é um paraíso, é na verdade um inferno onde o Homem foi desumanizado. A ciência, a tecnologia, e a organização social ao invés de estarem ao serviço do ser humano, escravizaram-no, sem que o Homem tenha consciência disso.

Vive-se o ano 632 A. F. (After Ford, Depois de Ford, depois do lançamento do primeiro modelo do Ford T, a 1 de Outubro de 1908, do industrial, pensador, e empresário Americano Henry Ford, 1863-1947, produzido em série, o primeiro empresário a aplicar as teorias de Taylor em grande escala), que corresponde ao ano 2540 da nossa era. 
O Homem é produzido em série, consoante as necessidades, dividido em cinco castas: alfas, betas, gamas, deltas, e ipsilões. 
O Homem é produzido numa escala que vai daqueles destinados aos mais importantes cargos e trabalhos de índole intelectual (alfas) até àqueles destinados a trabalhos estritamente braçais (ipsilões). 
Nesta produção industrial em massa do novo ser humano, este é selecionado e condicionado de maneira a «fazer amar às pessoas o destino social a que não podem escapar
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4 – 1984 (1949), de George Orwell
George Orwell (pseudônimo de Eric Arthur Blair) nasceu em 1903 em Bengala, Índia, no seio de uma família indo-britânica, estudou em Eton e, depois de concluídos os estudos, ingressou na polícia indiana imperial, na Birmânia, mas demitiu-se após seis anos, num momento em que havia adoecido. Desde então viveu dos seus trabalho jornalísticos e literários.


 
Os seus primeiros trabalhos literários, e diversas obras e ensaios posteriores, refletem as suas experiências biográficas: Os Dias da Birmânia, sobre os seus anos enquanto ao serviço da polícia colonial; Na Pior em Paris e Londres, sobre períodos de miséria que terá vivido nestas cidades, após o regresso à Europa; Homenagem à Catalunha, sobre a guerra civil espanhola, em que lutou ao lado dos Republicanos, e de que saiu gravemente ferido.

Em 1984, a sua última obra, publicada em 1949, um ano antes da sua morte precoce, vítima de tuberculose, vive-se num estado totalitário, onipresente e onipotente, controlado pelos princípios do Socing (socialismo inglês) pelos quais se rege o Partido; ninguém nem nenhuma atividade escapa ao controle do Grande Irmão (Big Brother): O Grande Irmão está a ver-te, através de um aparelho semelhante a uma televisão, que permite fazer a propaganda do partido e controlar as atividades dos cidadãos. 
O mundo encontra-se dividido em três blocos, ou super-estados: a Oceânia (cuja capital é Londres, onde decorre a ação), Eurásia, e Lestásia
A Oceânia está sempre em guerra, ora com a Lestásia, ora com a Eurásia; se está em guerra com um, está aliada a outro.

Sempre que o “parceiro” de guerra muda, todos os registros passados e presentes mudam, os jornais são reescritos, os livros são reescritos, a História é reescrita; se, por exemplo, estiver em guerra com a Lestásia, então sempre esteve em guerra com a Lestásia. 
A História é, assim, um eterno presente, que retira ao Homem a capacidade de reflexão sobre o mundo. 
Outro mecanismo para diminuir e controlar a capacidade de reflexão do Homem é a chamada Novilíngua – uma língua falada por todos, derivada do Inglês, ao qual vão sendo tirado todos os dias centenas ou milhares de palavras, com o objectivo de diminuir a capacidade de pensar. 
É responsável por estas atividades o Ministério da Verdade (Minivero, em Novilíngua)
Além do Ministério da Verdade, existem outros três Ministérios, que abaixo do Grande Irmão, na hierarquia desta sociedade, a controlam totalmente: «O Ministério da Paz, que se ocupava da guerra. O Ministério do Amor, que garantia a lei e a ordem. E o Ministério da Riqueza, responsável pelos assuntos econômicos». Minipax, Minamor, Minirico, em Novilíngua.

1984 - Toda a sociedade é regida pelos três slogans, ou lemas, do Partido: Guerra é Paz; Liberdade é Escravidão; Ignorância é Força
As atividades de todos os cidadãos são controladas pelos mecanismos de vigilância do Grande Irmão, pelos próprios cidadãos, que se controlam uns aos outros, individualmente ou organizados em patrulhas; porém, a mais importante das forças de vigilância é a Polícia do Pensamento
Controlando o pensamento, controla-se quase tudo. Além destas divisões, a sociedade encontra-se ainda dividida entre aqueles que pertencem ao Partido e os Proles
Dentro do Partido há ainda aqueles que pertencem ao Partido Interno (os que têm funções de maiores poderes e responsabilidades).

É nesta sociedade que Winston Smith começa a escrever um diário, à semelhança de D-503 em Nós, embora em 1984 Winston não seja o narrador. 
O diário é aqui mais simbólico, mostra o poder do objeto-livro, enquanto receptor e transmissor de ideias, enquanto objeto que dialoga com os outros e com o próprio autor, permitindo alargar o campo do pensamento. 
Qual o real significado desta obra? Um aviso contra as ameaças do Stalinismo, um aviso contra as ameaças que vinham do caminho que a política britânica estava a seguir? O Grande Irmão é uma projeção de Winston Churchill? O Socing (socialismo inglês) é uma crítica às políticas socialistas de Churchill? 
Muitos livros e muitas teorias já foram escritas e defendidas, desde a publicação da obra até aos nossos dias. 
Orwell, que morreu pouco tempo depois de a ter publicado, agastado com tão diversas interpretações, ao gosto das ideias, ideais, e quadrante político dos autores, veio a público defender que 1984 era uma sátira, e não uma profecia. 
A sua preocupação seria falar sobre a o confronto latente entre a Rússia e o Ocidente, que estava a tornar estas duas sociedades totalitárias e autistas uma em relação à outra. 
Profecia, ou não, muito do que escreveu Orwell mantém-se perigosamente atual, como aviso.
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5 – Farenheit 451 (1953), de Ray Bradbury
Ray Bradbury é mundialmente conhecido como autor de ficção científica, rótulo que inicialmente começou por desdenhar e recusar, pois queria que as suas obras fossem entendidas no mesmo sentido que eram as de Aldous Huxley ou George Orwell. 
Queixava-se ao seu editor que também as obras destes autores eram de ficção científica e ninguém lhes colocava este rótulo; além demais, considerava que assim entendidas, as suas obras teriam menos possibilidade de sucesso comercial e de serem tomadas a sério no plano da qualidade literária. Nasceu a 22 de Agosto de 1920 em Waukehan, Illinois, Estados Unidos, e faleceu a 6 de Junho de 2012, em Los Angeles, Califórnia.



As suas obras mais conhecidas, além de Farenheit 451, são, entre outras, As Crónicas Marcianas, Uma Sombra Passou Por Aqui, O Homem Ilustrado, ou A Cidade Inteira Dorme
Na sua atividade de escritor, Bradbury escreveu romances, contos, peças de teatro, peças para rádio e televisão, poesia, literatura infantil e também roteiros para cinema, atividade que lhe valeu o Óscar em 1956, pela adaptação da obra Moby Dick, de Hermann Melville. 
Tentou também, embora sem grande sucesso, tanto junto da crítica, como dos seus habituais leitores e dos leitores do gênero, o romance policial, com A Morte é Um Negócio Solitário.

Fahrenheit 451 apresenta-nos uma sociedade futura em que todos os livros serão queimados, atividade pela qual são responsáveis os “bombeiros” que não são mais chamados para apagar fogos mas para os atear. 
Guy Montag, o personagem principal, é um desses bombeiros; ao longo do tempo vai guardando exemplares para si, mas nunca ganha coragem para os ler, o que o poderia denunciar. 

Escrito nos primeiros anos da Guerra Fria, a obra é uma crítica à sociedade americana, que Ray Bradbury entendia que estava cada vez mais disfuncional. Nesta sociedade onde os livros são proibidos, as opiniões próprias são consideradas anti-sociais e hedonistas. Acabar com os livros é uma forma de suprimir o pensamento crítico. 
O título, Fahrenheit 451, refere-se à temperatura a que o papel (os livros) incendeiam.

Como todas as obras do gênero, Fahrenheit 451 foi submetido a diversas interpretações ao longo dos anos, porém focadas na ideia que a queima (proibição) de livros conduz à supressão de ideias dissidentes. Esta foi, aliás, ao longo da história da humanidade uma das formas pela qual as classes dominantes tentaram submeter as dominadas aos seus valores. 
Pense-se, por exemplo, no Santo Ofício (Inquisição) que além de queimar pessoas!, queimava livros (e os proibia, através do Index Librorum Prohibitorum), nas queimas de livros levadas a público por Hitler e os seus seguidores durante o período do Nazismo, na Alemanha e nos territórios ocupados, na censura que existe e existiu ao longo da história em diversos locais, e sob diversos regimes, ou na proibição da impressão de livros, por parte de Portugal, no Brasil, ou por parte de Inglaterra, nas colônias americanas. 
Sobre a obra, Bradbury declarou que foi escrita como uma declaração de amor aos livros e às bibliotecas, e que não era sua intenção tratar da censura, mas da forma como a televisão destruía o interesse na leitura. 
Não sendo um livro extenso, não direi mais sobre o enredo em si, pois incorria no risco de dizer tudo.
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Outras obras distópicas
Quem tenha interesse na leitura de obras distópicas (e utópicas) encontra diversos títulos, muitos no âmbito da ficção científica, mas não só. 
Entre as muitas existentes, destaco O Presidente Negro, de Monteiro Lobato, A Revolução dos Bichos, também de George Orwell, O Zero e o Infinito, de Arthur Koestler, Laranja Mecânica, de Anthony Burguess, O Almoço Nu, de William Burroughs, O Planeta dos Macacos, de Pierre Boulle, as obras de Philip K. Dick, J.G. Ballard, William Gibson, ou Neal Stephenson, por exemplo. 

Aldous Huxley e H. G. Wells, escreveram outras obras, que não sendo negativas, ou tão negativas, são consideradas utopias, mas ainda assim tão ou mais interessantes.


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(*) André Benjamim
Escritor, Poeta, Blogger, Sonhador. Licenciado em Psicologia das Organizações (Coimbra, Portugal). Tem vagueado pelo mundo, à procura de um cais, ou uma casa, ou qualquer coisa, que um dia talvez encontre - ou descubra - por sorte, azar, ou ironia do destino. Apenas sabe que ainda não chegou. «Sempre chegamos ao sítio aonde nos esperam.»

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