Pelo direito ao delírio !
Farley Ramos - "Obvious Magazine", outubro 2014
Entre os debates presidenciais e as notícias do jornal nacional um pouco de poesia nunca faz mal.
Sério, se alguém ainda guarda um pouco do carinho ao mundo que a gente tinha quando era criança esse alguém são os poetas.
O mundo anda tão chato, tão real e nem um pouco abstrato, as pessoas se preocupam demais com o que podemos tocar, com o que podemos enxergar...O corpo é o ópio da alma.
Vejo economistas, estrategistas do mercado, pensadores da sociedade, matemáticos, físicos serem considerados os grandes pensadores da humanidade e me pergunto: onde estão os caras que construíam novas cidades em guardanapos nas mesas de bar?
Onde estão os caras que pregavam no deserto? O deserto continua lá...E nesse deserto em meio as ondas invisíveis de rádio e televisão nós materializamos sonhos e transformamos em bens de consumo que poucos podem consumir, transformamos em claridade a clarividência, a ficção virou ciência...Tudo se expõe demais.
Dentro do cenário de reality shows que são cada vez mais irreais é preciso lembrar que ainda há algo em nós que nos dá o direito de existir.
Nós temos em nós esse fogo incandescente que querem apagar com as águas frias que nos fazem abrir os olhos.
Olhos abertos só enxergam a luz, e a luz que nos ilumina é a mesma que com o tempo nos cega, melhor nos guiarmos pela poesia da alma, pelo calor humano, pelas setas dos sentimentos...
A vida é mesmo um super-tempo, um extra-tempo, é estranho como a gente se apega ao passado e pensa no futuro, mas continuamos presos no presente, parado ninguém percebe que a vida é movimento.
Ah se o mundo soubesse o bem que dançar faz...Mas a gente é vergonhoso demais pra dançar sem música ou barulhento demais pra escutar o compasso, o ritmo delicado do mundo nos convidando a ser parte da festa.
Os poetas sabem que o mundo é só um detalhe, que os edifícios, as ruas calçadas, os corpos que se expõem em seus vestidos decotados nada mais são que o adorno do mundo, por isso voltam seus olhos pras pedras que lá estavam antes de tudo e lá estarão quando já tivermos ido, ah se a gente se preocupasse menos com ciência e mais com consciência...
Dizem que a depressão é o mal do século, fácil ficar deprimido num mundo de pronta entrega, onde tudo vem enlatado, encaixotado e rotulado...
Onde estão os Beatles e o Pink Floyd para nos salvar?
Você é de direita, você é de esquerda, você é feio, você é bonito...
Ah se o mundo soubesse que a beleza de ser é não saber o que se é e simplesmente ser o que for seja lá o que isso for...
Entre tantas guerras e reivindicações que travamos e fazemos pelo motivo errado, lutemos pelo direito da única coisa que pode nos salvar de nós mesmos e não se engane, somos nossos piores inimigos, lutemos pelo que nos tiraram quando decidiram que podiam decidir o que nos tirar, lutemos pelo que os poetas querem resgatar, lutemos pra que cegados pelo mundo tenhamos um colírio, lutemos pelo direito ao delírio.
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