O que é erro de gramática na Língua Portuguesa
Uma exposição sobre os diferentes tipos de erros gramaticais
Prof. Leo Ricino*
Num artigo nesta mesma revista, eu disse que nada é tão democrático quanto a língua. Mas… como toda democracia, ela requer sacrifícios e concessões no seu emprego. Democracia não é fazer o que se quer, mas sim o que é possível fazer, com respeito aos demais. O mesmo se pode dizer da língua: não se pode usá-la de qualquer jeito, mas sim de acordo com certo padrão.
Que padrão é esse? Quem estabeleceu esse padrão? Por que esse padrão e não outro padrão? Muitas perguntas, mas basta uma resposta. Temos de garantir à língua sua função primordial: promover a comunicação e, com ela, garantir a inteligibilidade das mensagens. Ora, para isso, é preciso usar um padrão linguístico que garanta a universalização de entendimento dentro da língua. Esse padrão é conhecido como normaculta e é usado pelos meios de comunicação, pelos livros não literários e literários, pelas pessoas de boa formação cultural... Basicamente, a norma-padrão ou culta é conhecida e reconhecida. É a ensinada nas escolas ou, pelo menos, deveria ser. A escola deve partir da língua usada pelos seus alunos e ensinar-lhes a norma-culta. Senão, a escola para nada serve, pois todas as disciplinas e todo o repertório do homem são consolidados pela língua-padrão. Empregar a língua culta amplia a possibilidade de ascensão social.
Se aceitássemos como padrão os vários regionalismos e mesmo dialetos, acabaríamos por formar outras línguas. O latim vulgar nos deu exemplo disso e transformou-se em várias línguas, incluindo a nossa. Talvez aqui possamos ampliar o conceito de poliglota. Deixa de ser só aquele que fala várias línguas para incluir também aquele que consegue pelo menos compreender e falar razoavelmente os vários regionalismos e dialetos de sua própria língua.
ERRO DE ORTOGRAFIA
Bem, voltemos aos erros de português. A língua portuguesa é etimológica, ou seja, as palavras são escritas de acordo com sua origem. Assim, não existe, por exemplo, “octagésimo” em português, porque a forma “octogésimo” já veio assim do latim octogesimu. Escrevemos “justiça” porque o “t” latino, em determinadas situações e a partir de algum momento, transformou-se em “ç” em português: justitia > justiça; petitio/onis > petição: locutio/onis > locução, etc.
Portanto, sendo nossa língua etimológica e assim consagrada nos oito países que a têm como oficial, escrever de forma que fuja à origem é um erro de português. Não dá para aceitar uma “caza” assim, com “z”, porque não era assim no latim. Ou “análize” porque veio do latim análusis. Erro de ortografia é, portanto, um erro gramatical e linguístico.
ERRO DE ACENTUAÇÃO GRÁFICA
Atualmente, após o recente Acordo Ortográfico, a língua portuguesa passou a ter 26 letras. Mas o número de fonemas e das diferentes entoações é maior (só com as vogais, por exemplo, temos 12 fonemas). É exatamente por essa diferença numérica que fomos obrigados a criar recursos auxiliares na representação gráfica dos fonemas e entoações. Por isso surgiram os sinais diacríticos ou notações léxicas (til, cedilha, acentos agudo, grave e circunflexo, hífen, trema e apóstrofo) e os dígrafos, esses também para adaptação ortoépica.
A acentuação gráfica é, por isso, uma necessidade da escrita para representar corretamente a pronúncia das palavras. É evidente que “medico” é diferente de “médico” e, na fala, isso não apresenta qualquer dificuldade. Mas como representar as duas pronúncias na escrita? Aí entra o acento gráfico colocado sobre o acento tônico da palavra representada: médico. “Amássemos” e “amassemos” não apresentam complicação na fala, mas apresentariam na escrita, mesmo sendo verbos diferentes, se não contássemos com o recurso do acento gráfico. Idem com “amara” e “amará”, “pôde” e “pode” etc. Diante do exposto, já se percebe a imprescindibilidade do uso dos acentos gráficos para a escrita. Portanto, erro de acentuação gráfica também é erro gramatical.
ERROS DE CONCORDÂNCIA
Seis das dez classes de palavras da nossa língua são variáveis, flexíveis. Essas flexões ocorrem para atender sintaticamente à concordância entre elas. Como já afirmei em artigo numa edição anterior desta revista, metaforicamente, podemos afirmar que há entre as classes de palavras dois fortes feudos, um tendo como senhor o substantivo, que domina quatro vassalos: o adjetivo, o artigo, o numeral e o pronome. Esses vassalos, absolutamente obedientes e servis, se flexionam para concordar com seu senhor e rei, o substantivo, em gênero (masculino, feminino e até neutro) e número (singular e plural). A esse fenômeno se dá o nome de concordância nominal.
Outro senhor na morfologia é o verbo, que tem um súdito seu: o advérbio. No entanto, quando passamos para a sintaxe, o verbo vira vassalo obediente do seu sujeito, totalmente subserviente a ele (deixemos de lado aqui a velhíssima discussão sobre quem é mais importante: o sujeito ou o predicado). Aí o verbo concorda com seu sujeito (sua pessoa reta, que sempre pode ser representada pelos pronomes pessoais retos) em número (singular e plural) e pessoa (1ª, 2ª e 3ª). A esse fato se dá o nome de concordância verbal.
Outro senhor na morfologia é o verbo, que tem um súdito seu: o advérbio. No entanto, quando passamos para a sintaxe, o verbo vira vassalo obediente do seu sujeito, totalmente subserviente a ele (deixemos de lado aqui a velhíssima discussão sobre quem é mais importante: o sujeito ou o predicado). Aí o verbo concorda com seu sujeito (sua pessoa reta, que sempre pode ser representada pelos pronomes pessoais retos) em número (singular e plural) e pessoa (1ª, 2ª e 3ª). A esse fato se dá o nome de concordância verbal.
Por causa do fenômeno da concordância é que não podemos aceitar frases como a dita por uma repórter do tempo numa rádio de São Paulo: “... isso porque o nível dos córregos e rios continuam bastante elevados.” (Rádio Jovem Pan, 21/12/09). O verbo deveria estar no singular porque seu sujeito é “o nível dos córregos e rios”, cujo núcleo é a palavra “nível”. E o “elevados” também deveria concordar com “nível” e passar para o singular. Também é errada a frase dita por outro repórter de outra rádio de São Paulo: “O pensamento dos Estados Unidos sobre combustíveis fósseis, aquecimento global e mudanças climáticas começam a mudar, e o etanol brasileiro foi beneficiado com isso.” (um repórter da Rádio Bandeirantes, janeiro de 2010), visto que o núcleo do sujeito é “O pensamento”, com o qual o verbo “começar” deveria concordar. No singular, portanto. Para falar de concordância, precisaríamos, no entanto, de um artigo exclusivo. Mas... erro de concordância é, sem dúvida, erro gramatical.
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