Publicações facebook - Nádia, 18 de janeiro 2014
Concerto de Dvorák - Affonso Romano de Sant’Anna
Soava na tela aquele concerto de celo de Dvorák:
eu via as imagens da orquestra
e as mãos e o rosto possesso Misha Misky abraçado ao
instrumento
engalfinhado numa amorosa luta com o sublime.
Lá fora
a intriga nos palácios,
as buzinas e os insultos,
a traição, a esperada, o luto.
Aqui
a perfeição preenchendo a sala
num momento de paz absoluta.
Hopper
Hopper
e a solidão dos objetos na vitrina
Hopper
e a solidão dos corpos na varanda
na janela
na campina
Hopper
e a solidão silente.
Hopper.
Hope.
Hopeless.
Tendo lido os jornais
- infectado a mente, enauseado os olhos -
descubro, lá fora, o azul do mar
e o verde repousante que começa nas samambaias da sala
e recrudesce nas montanhas.
Para que perco tantas horas do dia
nessas leituras necessárias e escarninhas?
Mais valeria, talvez, nas verdes folhas, ler
o que a vida anuncia.
Mas vivo numa época informada e pervertida.
Leio a vida que me imprimem
e só depois
o verde texto que me exprime.
(Affonso Romano de Sant’Anna)
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