quarta-feira, 24 de agosto de 2011

JORGE LUÍS BORGES - Não és os outros


Hoje, 24 de agosto é a data do 112º aniversário de Jorge Luís Borges, poeta e escritor argentino -  Buenos Aires, 24/08/1899 - Genebra, 14/6/1986


Não és os Outros
Jorge Luís Borges

Não há-de te salvar o que deixaram

escrito aqueles que o teu medo implora; 
não és os outros e encontras-te agora
no meio do labirinto que tramaram
teus passos. Não te salva a agonia
de Jesus ou de Sócrates ou o forte
Siddharta de ouro que aceitou a morte
naquele jardim, ao declinar o dia.
Também é pó cada palavra escrita
por tua mão ou o verbo pronunciado
pela boca. Não há pena no Fado
e a noite de Deus é infinita.
Tua matéria é o tempo, o incessante
tempo. E és cada solitário instante.

Jorge Luis Borges, in "A Moeda de Ferro" / Tradução de Fernando Pinto do Amaral
*            *            *

Instantes
Jorge Luís Borges

Se eu pudesse viver novamente a minha vida, na próxima trataria de cometer mais erros.

Não tentaria ser tão perfeito, relaxaria mais.

Seria mais tolo ainda do que tenho sido, na verdade bem poucas coisas levaria a sério.

Seria menos higiênico.

Correria mais riscos, viajaria mais, contemplaria mais entardeceres, subiria mais montanhas, nadaria mais rios.

Iria a mais lugares onde nunca fui, tomaria mais sorvete e menos lentilha, teria mais problemas reais e menos problemas imaginários.

Eu fui uma dessas pessoas que viveu sensata e produtivamente cada minuto da vida, claro que tive momentos de alegria. Mas se pudesse voltar a viver, trataria de ter somente bons momentos. Porque, se não sabem, disso é feita a vida, só de momentos, não percas o agora.

Eu era um desses que nunca ia a parte alguma sem um termômetro, uma bolsa de água quente, um guarda-chuva e um pára-quedas. Se voltasse a viver, começaria a andar descalço no começo da primavera e continuaria assim até o fim do outono.

Daria mais voltas na minha rua, contemplaria mais amanheceres e brincaria com mais crianças, se tivesse outra vez uma vida pela frente.

Mas já viram, tenho oitenta e cinco anos e sei que estou morrendo.

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