terça-feira, 6 de dezembro de 2011

ELISA, A IRMÃ


Alguém já ouviu algo sobre Elisa Lispector?  Pois é... foi funcionária pública por 30 anos e escreveu sete romances.
Caso de 'segundo plano', por ter nascido em família que já tem alguém famoso.
Tem um único livro em catálogo hoje em dia, "No Exílio" (1948), reeditado em 2005 pela José Olympio.
O mais elogiado (ou, como querem alguns, um livro que "não deixa nada a dever a Clarice") é "O Muro de Pedras", cujos direitos a JO também comprou, mas que acabou nunca sendo reeditado, porque as vendas de "No Exílio" não foram muito emocionantes.
Prevista para as próximas semanas a publicação de "Retratos Antigos", que Elisa escreveu nos anos 70. O texto ajuda a esclarecer pontos da biografia dos Lispector desde antes de eles pensarem em sair da Ucrânia. É um texto informal, que Elisa fez para os sobrinhos (ela própria nunca casou nem teve filhos) e que revela histórias, singelas até, que talvez Clarice mesmo não soubesse.

Esses dados estão na reportagem de capa de 'Ilustríssima', suplemento do jornal Folha de S.Paulo, de 04/12/2011. (a seguir)

Relato biográfico resgata Elisa, a irmã mais velha de Clarice Lispector
RAQUEL COZER


Da esquerda para a direita, as irmãs Tania, Elisa e Clarice Lispector em fotografia tirada na década de 20

Da esquerda para a direita, as irmãs Tania, Elisa e Clarice Lispector em fotografia tirada na década de 1920

Seis dias antes da morte de Elisa Lispector, irmã mais velha de Clarice, o barco Bateau Mouche 4 afundou na baía de Guanabara.
O naufrágio que matou 55 pessoas na véspera do Réveillon de 1989 não tinha relação com Elisa --que morreu naquele 6 de janeiro com câncer e problemas renais--, mas foi responsável por uma triste ironia final em sua história.
No dia 7, o registro na imprensa carioca do óbito da autora de "No Exílio" (1948) foi ofuscado pelo anúncio, muito maior, da missa de sétimo dia da mais famosa vítima do Bateau Mouche, a atriz Yara Amaral, que até pouco antes estava no ar na novela "Fera Radical", da Globo. Com isso, quase ninguém àquela altura soube da morte de Elisa --como se não bastasse ela ter passado a vida sob a sombra de Clarice (1920-77).
(...)
 O que por décadas apenas a família soube é que, nos anos 70, Elisa iniciou um resgate não ficcional da saga dos Lispector. É esse material, datilografado e rabiscado em 28 laudas --"esboços a serem ampliados", como anotou Elisa--, que a Editora UFMG lança nas próximas semanas. "Retratos Antigos" [org. Nádia Battella Gotlib, 144 págs., preço a definir] sai com dois cadernos de fotos, a maioria inédita. As mais antigas, dos avós de Elisa, são do início do século 20, na Ucrânia, então pertencente à Rússia.

LEGADO
Elisa, que nunca casou nem teve filhos, dedicou aquelas páginas aos sobrinhos, em especial a Nicole --neta de Tania, a irmã do meio. O texto foi concebido para que, crescida, a sobrinha-neta soubesse o passado da família.
A história é contada a partir de desbotadas fotografias de um álbum "aristocrático", de "capa e contracapa trabalhadas em alto relevo sobre almofadas forradas de puro couro da Rússia", uma lembrança dos tempos em que os Lispector ainda resistiam aos pogroms, os ataques contra judeus e outras minorias, comuns na Rússia do início do século 20.
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"É uma obra importante sobre a questão da imigração judaica no Brasil", afirma Wander Melo Miranda, professor de literatura comparada e diretor da Editora UFMG.
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Para além da temática judaica, "Retratos Antigos" ajuda a esclarecer ao menos um ponto nebuloso da biografia de Clarice: a doença que matou, lentamente, sua mãe. O texto explicita que Mania Lispector sofria de hemiplegia (paralisia parcial do corpo) e que esse estado resultou de um "trauma decorrente daqueles fatídicos pogroms".
Não é pequeno o impacto da paralisia da mãe na vida e obra de Clarice. Para ficar num raro exemplo explícito, já que em geral ela era mais discreta que isso, há a crônica "Restos de Carnaval". O texto lembra a noite em que ela, criança, precisou interromper seus preparativos para a festa e correr envolta em crepom pelas ruas de Recife atrás de remédios para a mãe. "Quando horas depois a atmosfera em casa acalmou-se, minha irmã me penteou e pintou-me. Mas alguma coisa tinha morrido em mim."
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PRIMOGÊNITA
Se a autora de "Laços de Família" (1960) motiva discussões que para alguns extrapolam sua obra, Elisa permanece pouco estudada.
A primogênita de Pinkhas e Mania Lispector lançou o primeiro livro, "Além da Fronteira", em 1945, aos 34 anos, dois anos após a estrondosa estreia de Clarice, com "Perto do Coração Selvagem". Depois, publicou mais seis romances --o quarto, "O Muro de Pedras", considerado o seu melhor, recebeu prêmios da editora José Olympio e da Academia Brasileira de Letras-- e três volumes de contos.
Afora o que hoje está em sebos, a obra de Elisa quase desapareceu. Um único romance, "No Exílio", está à venda pela José Olympio, em reedição de 2005. Na ocasião, a editora comprou também os direitos de "O Muro de Pedras", mas as vendas fracas de "No Exílio" a fizeram "repensar o projeto da autora na casa", segundo a gerente editorial, Maria Amélia Mello.
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