quinta-feira, 5 de janeiro de 2012

'A CARTEIRA DE MEU TIO' - Joaquim Manuel de Macedo


Joaquim Manuel de Macedo é autor de " A moreninha" - seu romance mais conhecido e até adaptado para o cinema e a televisão.
Quando lemos pela primeira vez sua obra - geralmente no ensino médio, por "obrigação", porque o professor alerta que cobrará em prova, essas coisas -  não percebemos o extraordinário cronista de costumes que ali se apresenta. Há em seus escritos toda uma observação da época e uma fina ironia ao descrever os desmandos políticos e a vida das pessoas na cidade do Rio de Janeiro.

Transcrevo uns trechos de um outro livro do autor - "A carteira de meu tio" (publicado em 1855!)  - e que me chamaram a atenção pela pertinência e atualidade do assunto.

"Senhores, eu sou sem mais nem menos o sobrinho de meu tio: não se riam, que não há razão para isso: queriam o meu nome de batismo ou de família?
Não valho nada por ele, e por meu tio sim, que é um grande homem. Estou exatamente no caso de alguns candidatos ao parlamento e a importantes empregos públicos, cuja única recomendação é neste o ser filho do Sr. Fulano, naquele ser neto do Sr. Beltrano, e até às vezes naquele outro ser primo da Sra. Sicrana."
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"Com efeito, do mesmo modo que sucede a todos os vadios de certa classe, a primeira idéia que me sorria, tinha sido a política!
- Mas olha que a política não é meio de vida - observou o velho.
- Engano, meu tio! A pátria deve pagar bem a quem quer fazer o enorme sacrifício de viver à custa dela."
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"A pátria é uma enorme e excelente garopa: os ministros de estado a quem ela está confiada, e que sabem tudo muito, mas principalmente gramática e conta de repartir, dividem toda nação em um grupo, séqüito e multidão: o grupo é formado por eles mesmos e por seus compadres, e se chama – nós -; o séqüito, um pouco mais numeroso, se compõe dos seus afilhados, e se chama – vós -; e a multidão, que compreende uma coisa chamada oposição e o resto do povo, se denomina – eles -; ora aqui vai a teoria do eu: os ministros repartem a garopa em algumas postas grandes, e muitas mais pequenas, e dizem eloqüentemente: “as postas grandes são para nós, as mais pequenas são para vós” e finalmente jogam ao meio da rua as espinhas, que são para eles. O resultado é que todo o povo anda sempre engasgado com a pátria, enquanto o grupo e o séquito passam às mil maravilhas à custa dela!"

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